Doha é diferente. Copa do Mundo no deserto, mais ainda. Nem cabe em uma Lâmpada Maravilhosa de um gênio pronto a sair e atender seus desejos. Um Aladim. É quase tudo isso. A Copa aqui é um deleite. Um conto das Mil Maravilhas. Mesmo no Qatar, país marcado por não respeitar os direitos humanos, por ser homofóbico e tratar a mulher sem direitos básicos.

A Copa não tem nada com isso. É como uma miragem. Prima por organização, zelo e atenção dedicada a torcedores e mídia em geral. Por onde você anda há gente educada a mostrar os caminhos a seguir, resolver seus problemas. Tratar gente como gente, pelo menos nessa primeira semana de bola rolando nos estádios futuristas arejados com ar-condicionado.

Sim, pode ser mesmo uma miragem. Erguido no deserto a custo estimado de 220  bilhões de dólares – a Rússia despejou 11,6 bilhões em 2018 e o Brasil, 15 bi em 2014 –, gasto sem precedentes na história de 22 Copas até essa de 2022, o Mundial de futebol é um dos braços que o Qatar usa para abraçar o mundo.

Muito dinheiro de um país com as maiores reservas de petróleo e gás natural do planeta. Uma riqueza natural garantida até pelo menos o ano de 2056. Portanto, um país a assinar cheque em branco, seja para Fifa ou Paris. Não vamos nos esquecer que o clube Paris Saint-Germain, de Neymar e Messi, tem como dono o estado do Qatar.

Futebol é um dos meios de o Qatar fazer suas gentilezas e vender sua imagem aos incrédulos mundo afora.

Não por acaso nas ruas você tropeça em gente feliz na comunhão do futebol. Ruas tomadas por torcedores de todos os cantos. Muitos a vestir fantasias árabes. Difícil saber se os locais são todos cataris – no país de 3 milhões de habitantes, os nativos são apenas 10% da população, garantem os órgãos oficiais, os “restantes” 2,7 milhões, são paquistaneses, indianos, africanos, filipinos e de países vizinhos do Oriente Médio em busca do pote de ouro da sobrevivência.

As ruas, vielas e pedras sobre areia também estão tomadas por gatos. Abandonados. Felinos foram despejados em Doha há tempos para atuar como predadores dos ratos, muitos ratos. Cumprido o papel de exterminadores de roedores, os gatos perambulam pela cidade. Maioria deles famintos e esqueléticos.

Não podemos se esquecer dos estádios. Obras faraônicas, cintilantes, a brilhar como ouro no sol. São as joias da coroa que o emir entregou aos torcedores de todo o mundo e aos jogadores e seus técnicos das 32 seleções classificadas a jogar a Copa. Ao custo de mais de 2 mil operários mortos nas construções, segundo denúncias de entidades internacionais de direitos humanos.

Tudo muito bonito. Cartões postais. Metrô de chão de mármore e trens luxuosos a transportar a manada da bola. Para lá e para cá, incessante. Uma multidão sem máscara, sem medo da Covid, feliz da vida. E sem poder beber cerveja, proibida pelo emir há poucas horas da abertura da Copa.

Tem gente dormindo em containeres, verdadeiros fornos de lata. Em hotéis inacabados, em apartamentos e vilas ou em luxuosos Cruzeiros ancorados no Golfo Pérsico. Todos, sem exceção, bem caros.

É o Qatar despejando fortunas e recebendo uns bons trocados de volta.

Muita coisa há ainda a se descobrir em Doha. Estamos na primeira semana da Copa. Por enquanto, uma miragem. Miragens, é bom lembrar, desaparecem ao esfregar dos olhos no calor do deserto.

Doha, 24 de novembro, 2022. Por Luiz Antônio Prósperi


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