Luiz Antônio Prósperi, 13 agosto (00h23)
Vivemos no país dos gigantes. A cada conquista ou derrota, um feito extraordinário no campo, na quadra, no mar, seja onde for, numa disputa esportiva, a gente tromba com um gigante. Se chora a dor do jogo perdido, lá está um gigante a consolar. Se abre o sorriso na vitória, um gigante está a seu lado. Se veste uma camisa de um clube histórico e honra suas cores, a camisa é do gigante.
São tantos gigantes a nos rodear que a expressão ou simbolismo já é mais do que um lugar comum.
A Olimpíada Paris 2024 está aí para comprovar a verdade. Uma medalha conquistada ou perdida era acompanhada na mídia esportiva com a palavra de efeito “gigante”. Zé Roberto, decano do vôlei brasileiro, chorando de emoção com a medalha de bronze, inevitável. “Zé Roberto, você é gigante”.
Rebeca multiplicando saltos na trave, no solo… “A pequena gigante do Brasil na ginástica”.
Gabriel Medina lamentando a falta de ondas no surfe. “As ondas não vieram Medina, mas você é gigante”.
Bia Souza no judô chorando com a medalha de ouro pendurada no pescoço. “Bia, a nossa gigante do judô.”
Caio Bonfim na marcha atlética mordendo a medalha de prata… “Só você sabe a sua luta para chegar até aqui. Você é gigante, Caio”. Calderano no tênis de mesa… “Medalha não veio, mas você é gigante”.
Meninas do futebol feminino em lágrimas após derrota na final contra os EUA e a rainha Marta se despedindo com a medalha de prata no peito. “Meninas gigantescas. Perdemos para uma grande seleção. Marta, muito obrigado, você é gigante”.
Atletas de outros países, seleções de basquete, vôlei, polo-aquático, nas pistas de atletismo… um monte de gigantes.
Deixando a Olimpíada de lado, voltando ao futebol de todos os dias no Brasil, nos intermináveis programas de debate na TV, streaming e influencers a respeito dos jogos no Brasileirão, Libertadores e por aí vai, se nota o forte domínio dos gigantes.
“Que vitória gigantesca do….”. “Que gol gigante”… “Essa camisa é gigantesca”… “Garoto, você é gigante”… “Os dois times honraram sua história gigantesca”…
“Vini Jr, você é gigante”… “Neymar você já deu mostras de que é um gigante”.
Temos tantos gigantes no futebol que corremos o risco de ser esmagados por um pisão em falso de um deles.
É moda. É atual. É da hora. Demorou. Tipo falar gigante a todos feitos em um simples jogo de futebol no Brasil.
A dita imprensa ou jornalismo esportivo adotou o gigante como seu. E não se tem certeza de que os gigantes serão abandonados.
Lá pelos idos de 1990, na redação do Jornal da Tarde (diário paulista do grupo Estadão), nosso editor de Esportes José Eduardo Carvalho vetava que se usasse a expressão “todo-poderoso”. Era muito comum na época se referir ao britânico Bernie Ecclestone como o “todo-poderoso” chefão da Fórmula 1 nos tempos de Ayrton Senna. Repórter ou redator desavisado que lascava “todo-poderoso” na matéria levava uma bronca e era obrigado a refazer o texto. O “todo-poderoso” de hoje é o “gigante”.
Gigante, naqueles tempos, não se usava para outra referência a não ser retratar o gigantismo na essência do significado do substantivo masculino.
A primeira vez que reparei no uso do “gigantesco” na mídia esportiva foi em uma reportagem de Vinicius Mesquita, então um novato na editoria de Esportes do Jornal da Tarde e hoje diretor do UOL. Em uma matéria com Neto, na época jogador do Corinthians nos anos 90, Vinicius escreveu “Neto e seu calção gigantesco”. O repórter tinha toda razão. Neto era um atleta com peso um pouco acima da média e usava calções números acima do seu figurino. Gigantescos.
Que me perdoem os craques de hoje no jornalismo esportivo: deixem os gigantes em paz ou tirem um tempo de suavidade assistindo ao filme “Bom Gigante Amigo”, do gênio Steven Spielberg lançado em 2016. Leitores, espectadores da TV, plataformas streaming e aloprados em geral da vida digital agradecem.





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