Como Palmeiras e Flamengo se tornaram as superpotências do futebol sul-americano

A final da Libertadores marca o mais recente capítulo de uma rivalidade que domina o continente graças aos níveis europeus de financiamento e recrutamento de jogadores


Caio Carrieri, do jornal The Guardian (Inglaterra) – 28 novembro 2025 

Para surpresa de poucos e desespero de muitos, será Palmeiras ou Flamengo quem levantará o troféu da Copa Libertadores no sábado, no Estádio Monumental, em Lima. Com a final deste ano, um desses dois gigantes brasileiros terá conquistado cinco das últimas sete edições, uma sequência que evidencia como ambos os clubes se transformaram em superclubes sul-americanos, remodelando o cenário competitivo no processo.

Mas esta final é mais do que apenas mais um capítulo na hegemonia brasileira, interrompida apenas pelo triunfo do River Plate em 2018 nos últimos nove anos. Ela marca o ápice de uma evolução de uma década que viu Palmeiras e Flamengo se consolidarem como instituições com alcance, recursos e expectativas de nível europeu.

A ascensão desses clubes alterou a própria lógica da Libertadores, seu mercado de transferências, seu equilíbrio competitivo e até mesmo a noção do que é possível alcançar para os clubes sul-americanos

Quem vencer se tornará o time brasileiro com mais títulos continentais (quatro), e o Brasil empatará com a Argentina com 25 troféus da Libertadores – mesmo que o Independiente, com sete coroas, continue sendo o clube mais vitorioso da competição.

A final também tem um significado extra no cenário nacional: está cinco pontos à frente do Palmeiras na liderança do campeonato, com duas rodadas restantes, depois que o Verdão não venceu nenhuma das últimas cinco partidas – sua pior sequência na temporada. O clube carioca também venceu os dois confrontos diretos entre as equipes, em casa e fora, no início deste ano.

E embora o futebol seja o protagonista, o local traz suas próprias complicações. A Conmebol, entidade que rege o futebol no continente, manteve a final na capital peruana, apesar de um estado de emergência de 30 dias em meio ao aumento da violência e aos protestos liderados por jovens. Desde a adoção do formato de final em jogo único, semelhante ao da UEFA, em 2019, o custo para os torcedores que viajam para o estádio disparou. Com as viagens pela América do Sul sendo muito menos simples e acessíveis do que na Europa, voar para o Peru saindo de Londres agora é mais barato do que saindo de São Paulo ou do Rio de Janeiro, o que levantaria dúvidas sobre se os 80 mil lugares serão preenchidos.

O Palmeiras chegou à final de forma milagrosa, revertendo uma derrota por 3 a 0 no jogo de ida, na altitude de Quito, para golear a LDU do Equador por 4 a 0 em casa. Isso aconteceu após uma vitória convincente nas quartas de final sobre o River Plate, por 5 a 2 no agregado, um confronto memorável pelo primeiro tempo em Buenos Aires, onde o simplesmente dominou os argentinos.

Vitor Roque é do Palmeiras
Vitor Roque no Palmeiras – foto: Palmeiras oficial

Os atacantes Vítor Roque e Flaco López se tornaram os pilares do Palmeiras na segunda metade da temporada. No início do ano, apenas um deles era titular, com Estêvão – então prestes a se transferir para o Chelsea – sendo a principal ameaça ofensiva da equipe antes de sua ida para Londres após o Mundial de Clubes. Desde a saída do jovem, Roque e López assumiram essa responsabilidade juntos, proporcionando a Abel Ferreira um ataque muito mais direto e dinâmico.

Juntos, eles somam 43 gols nesta temporada, e López chega a Lima como um dos artilheiros da Libertadores deste ano, com sete gols. O bom desempenho da dupla tem sido reconhecido internacionalmente: Roque foi convocado por Carlo Ancelotti para a seleção brasileira, enquanto López estreou pela seleção argentina, apesar de não ter marcado nos últimos nove jogos pelo clube, seu maior jejum na temporada.

O próprio Roque personifica o poderio financeiro do Palmeiras. A transferência do jogador de 20 anos por 22,5 milhões de libras em fevereiro – vindo do Barcelona após uma passagem frustrante pelo Camp Nou e um empréstimo ao Betis – tornou-se a maior quantia já paga por um clube brasileiro. Isso fez parte de um amplo programa de investimentos: ao longo de 2025, o Palmeiras investiu 100 milhões de libras em 12 contratações, o maior gasto em um único ano por qualquer clube no país.

Isso se deve a um ciclo virtuoso em um clube que vive a era mais vitoriosa de sua história. Abel Ferreira, agora o técnico há mais tempo no cargo no Brasil em três décadas, conquistou 10 troféus em cinco anos, incluindo dois títulos consecutivos do Campeonato Brasileiro, duas Libertadores seguidas, entre elas a vitória sobre o Flamengo em Montevidéu em 2021, e uma Copa do Brasil.

O sucesso trouxe acordos comerciais mais robustos e, inevitavelmente, interesse da Europa. O Palmeiras também lucrou com um fluxo constante de talentos da base – entre eles Estêvão para o Chelsea, Endrick para o Real Madrid, Vitor Reis para o Manchester City, Luis Guilherme para o West Ham, Danilo para o Nottingham Forest, Gabriel Veron para o Porto e Kevin, agora no Fulham, para o Shakhtar Donetsk – arrecadando até £194,6 milhões apenas com os bônus dessas vendas.

Ferreira recebeu propostas de clubes da Premier League: Everton, Nottingham Forest e, mais recentemente, Wolverhampton. Mas sua situação no Palmeiras é excepcionalmente sólida. O português trabalha em um ambiente de confiança, apoiado por uma hierarquia profissional e estável, e ganha 6,2 milhões de libras por ano, um valor que nem mesmo alguns clubes da Premier League conseguem pagar e comparável ao que Ruben Amorim ganha no Manchester United.

O Flamengo busca vingança no maior palco da América do Sul após vencer o Estudiantes nos pênaltis nas quartas de final e derrotar o Racing nas semifinais, com ambos os confrontos decididos fora do Rio. Filipe Luís, ex-lateral-esquerdo do Chelsea e do Atlético de Madrid, está em sua primeira temporada completa como técnico, tendo assumido o comando no meio do ano passado e levado o time rubro-negro  ao título da Copa do Brasil logo em seguida.

Como titular do Flamengo, Filipe Luís conquistou a Libertadores em 2019 e 2022 e foi vice-campeão em 2021, perdendo para o Palmeiras. Agora, ele lidera um elenco repleto de estrelas, moldado por uma década de gestão cada vez mais profissional, o que permitiu ao clube manter, por anos, o que é considerado o time mais forte do continente. O Flamengo finalmente está concretizando seu potencial comercial como o clube mais popular do Brasil: no ano passado, registrou receita recorde de 190 milhões de libras, com o Palmeiras logo atrás, com 180 milhões de libras.

Essa estabilidade manteve o Flamengo consistentemente competitivo no topo do futebol sul-americano, conquistando 14 troféus em sete anos, incluindo duas Libertadores, dois campeonatos nacionais e duas Copas do Brasil.

Bruno Henrique e Arrascaeta, armas do Flamengo – foto: Fifa oficial

O Rubro-Negro gastou quase £50 milhões em sete jogadores em 2025, incluindo a contratação de Samuel Lino, do Atlético de Madrid, por £20,5 milhões, que tornou o ponta de 25 anos a contratação mais cara da história do clube. A lista também inclui outro ex-jogador do Atleti, Saúl Ñíguez, além de nomes como Jorginho, Danilo e Emerson Royal, que já atuaram na Premier League.

“Esses jogadores já jogaram com e contra os melhores do mundo, e essa experiência só ajuda o Flamengo a manter o sucesso que construiu dentro de um projeto bem estabelecido”, disse David Luiz, que conquistou a Libertadores de 2022 com o Rubro-Negro.

Apesar de todo o investimento, foi um jogador que passou toda a sua carreira na América do Sul que se tornou a figura principal do Flamengo. Giorgian de Arrascaeta, o maestro uruguaio do meio-campo, já soma 23 gols e 17 assistências na temporada mais prolífica de sua carreira.

“Enquanto o Palmeiras de Abel é conhecido pelo coletivo e pela força mental como duas de suas principais virtudes, o Flamengo parece quase uma seleção nacional, mais refinada tecnicamente devido à profundidade do elenco e ao estilo de jogo”, disse Marcos ao The Guardian. O ex-goleiro conquistou a Copa Libertadores com o Palmeiras em 1999 e a Copa do Mundo com o Brasil em 2002, ambas sob o comando de Luiz Felipe Scolari.

“Esta é uma final que define a carreira e pode levar os jogadores a outro patamar. Foi graças às minhas atuações na Libertadores que tive o privilégio de vestir a camisa da Seleção.”


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