Felipe Melo fora da curva

Palmeiras e patrocinadora torraram R$ 115 milhões em contratações de jogadores porque tinham dinheiro para gastar. Cuca, desde seu início de carreira de treinador, carrega suas mandingas e crenças por onde passa. Ajoelhado ou não. De calça vinho ou não. Borja e Guerra, apontados como os principais destaques da Libertadores de 2016 quando foram campeões com o Atlético de Medellín, eram objeto do desejo da maioria dos clubes envolvidos na atual Libertadores. Keno e Raphael Veiga, brilhantes no Brasileirão do ano passado, estavam na mira das principais potências do futebol brasileiro. Mauricio Galiotte, novo presidente do clube, assumiu em novembro e de cara resolveu as pendengas com a WTorre, sócio-proprietária do Allianz Parque, e acalmou a fúria da dona da Crefisa, em constante atrito com o então presidente Paulo Nobre. Alexandre Mattos, tricampeão brasileiro, somando os títulos de Cruzeiro e Palmeiras, é um dos executivos da moda e currículo. A única peça que não se encaixa, fora da curva, é mesmo Felipe Melo. A queda do Palestra na Libertadores e fracassos consecutivos na temporada passam por Felipe Melo.

Antes de arremessar as pedras é preciso entender o contexto da culpa de Felipe Melo e seus efeitos na debacle do Palmeiras. Não é apenas a contratação em si do volante, um desses amados malditos do futebol. Quando Alexandre Mattos pensou e correu atrás do jogador, na sua cabeça passava a ideia de que Libertadores requer jogadores cascudos. Levizinhos como Tchê Tchê não dariam conta do recado. Por isso não levou em consideração o famoso custo benefício. Foi lá, ofereceu uma picape de dinheiro e convenceu Melo a vestir as cores verde e branca. Assim como alguns decadentes no mercado europeu  – Diego, Robinho, Hernanes, Jadson, Thiago Neves, entere outros -, Felipe Melo voltava ao Brasil.

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Mattos não raciocinou que ao trazer um jogador com esse perfil viveria dias de muita tempestade e pouca bonança. E, por tabela, quebrou um modelo que havia dado muito certo na campanha do título brasileiro de 2016. Antes prevalecia solidariedade, nos vestiários e no campo. Não havia um astro a fazer o time girar em sua órbita. Com Felipe Melo essa norma não poderia ser seguida. Ou se reza na cartilha dele ou nada feito. Todos planetas ao redor de um único sol.

Melo encontrou terreno fértil para semear suas ideias. Se deparou com um técnico aprendiz, Eduardo Baptista, pouco acostumado a lidar com personagens de alto quilate como  ele, Felipe Melo, e tomou conta do terreno. Nesse contexto, se investiu de líder ofuscando Fernando Prass e Zé Roberto, esteios da campanha de 2016, acostumados ao diálogo. Não haveria mais líderes, e sim um líder. Com seu poder de convencimento, amealhou alguns menos cotados no grupo de jogadores e se fortaleceu.

Pavio aceso, Melo explodiria mais cedo ou mais tarde. A Batalha de Montevidéu contra o Peñarol deixou claro que o Palmeiras dali para frente seria guerreiro e valente. Melo se encarregou de se defender dos uruguaios com alguns socos de pugilista. Baptista resolveu dar murro na mesa e estufar as veias do pescoço dizendo que ninguém de fora do Palmeiras passaria por cima dele. Melo pegou um gancho de seis jogos e deu uma enorme dor de cabeça ao comando do Palmeiras. Baptista não resistiu e foi demitido.

Fora de campo, Felipe Melo ainda incendiou as redes sociais ao bradar “pau nos vagabundos que fazem greve e Bolsonaro neles”, em pleno feriado de 1.º de maio, o Dia do Trabalhador.

Alexandre Mattos percebeu que deveria se proteger com um escudo e apressou a trazer Cuca de volta. Mattos sabia que Cuca não concordaria com os métodos de Melo. Não demorou e os dois se encrencaram no momento mais difícil do Palmeiras na temporada. A casa caiu com a eliminação diante do Cruzeiro na Copa do Brasil. “Com esse não dá mais, vou rachar ele no meio, covarde”, disse o jogador a respeito de Cuca.

Felipe Melo foi apartado do ambiente no processo que custou tempo e desavenças até o ambiente se acalmar em nome da honra, isto é, avançar na Libertadores diante do Barcelona de Guayaquil. Entre o fim da tempestade e os dias de sonhada bonança, Palmeiras viveu um drama desnecessário.

Cuca, um tanto preso às convicções de 2016 e atordoado com o desgaste no embate com Melo, não conseguiu reinventar o time. “Cheguei ao meu limite”, revelou após a queda na quarta-feira diante do Barcelona equatoriano. Errou à beça nas escolhas e soluções no jogo mais importante do ano. E assistiu ao fim do projeto ajoelhado com sua calça vinho na grama orvalhada e medalha sangrando os dedos no aperto da mão.

De volta ao futuro, Mattos entra no paredão por ter apostado em Felipe Melo sem pensar nas consequências. Palmeiras foi notificado na Justiça por assédio moral ao jogador. Clube, que já investiu quase R$ 5 milhões no volante (entre salários e bônus), corre para fazer uma rescisão amigável do contrato com o volante. Roubando um conceito do nosso colunista José Eduardo Carvalho,  Melo representa o retrocesso do retrocesso.

Na hora de fazer as contas, o polêmico jogador mais deu prejuízo do que lucro no campo. Não decidiu um jogo. Apenas conquistou corações de torcedores acostumados a aplaudir guerreiros e condenar os bons moços bons de bola. Futebol tem disso. La Nave Va.

(TEXTO PUBLICADO NO CHUTEIRA FC – LEIA MAIS NOTÍCIAS E OPINIÃO DE FUTEBOL)