Futebol vive em Medellín

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O que faz você sair de casa vestido de branco? Sair de casa e ir até um estádio numa noite de quarta-feira sem jogo para ver? Receber um buquê de flores no portão de entrada, uma vela e ocupar um assento na arena? Pra quê? Seu time não vai jogar. O adversário não veio.

Mas você foi e ajudou a lotar a arquibancada. Quem não conseguiu entrar fincou pé nas ruas ao redor, todos de branco diante do complexo de cimento de nome Atanasio Girardot. A multidão não se arrastou por nada, dentro e fora do estádio – coisa de 80 mil pessoas. Caminhou até ali por amor ao futebol. Não queria torcer, apenas ser solidária em Medellín. Nem era por paixão ao seu time. Era por respeito ao adversário.

Todos foram a um templo da bola nesta quarta-feira cumprir o cerimonial aos mortos na Tragédia da Chapecoense.

Celebraram cada rito da homenagem como se o seu Atlético Nacional tivesse feito um gol. Cantaram alto o nome do adversário “Chape, Chape”.

Derramaram lágrimas. Seguraram a chama das velas com as mãos para o foguinho não se apagar nunca.

Aplaudiram. Jogaram os magros buquês de flores brancas e amarelas ao gramado. Estenderam faixas “Nasce uma nova família”, “Estamos contigo, Chapecoense”.

Ouviram em silêncio os clarins do “Toque do Silêncio” nos metais de uma banda do exército colombiano. Aplaudiram de novo. Choraram de novo.

Acompanharam crianças perfiladas, vestidas com uniformes do Atlético e Chapecoense, libertarem balões brancos ao céu ao anúncio de cada uma das vítimas do desastre… jogadores, dirigentes, jornalistas.

Em um e outro momento, se calaram e ouviram violinos de uma pequena orquestra instalada na beira do gramado. Foram obrigados a aguentar discursos de políticos colombianos e, pior, de alguns execráveis brasileiros sem legitimidade para estarem ali.

Suportaram tudo e não desistiram. Só arredaram pé quando, como se fosse um jogo normal, o tempo regulamentar se esgotou.

Foram embora para suas casas em Medellín sem ver o jogo que não existiu e nunca mais vai ser jogado. Mas deixaram um gesto e um recado ao mundo: o futebol está vivo.

p.s: antes de encerrar, pensei muito como o mestre Gabriel Garcia Márquez relataria um acontecimento dessa proporção, colombiano que era. Gostaria muito que ele estivesse ali, no estádio Atanasio Girardot, nesta noite de quarta-feira 30 dezembro de 2016. Se é que não estava…