Seleção Brasileira precisa de um modelo e jornalismo esportivo voltar a ser sério

Aeroporto Heathrow, Londres, última escala partindo do Qatar até São Paulo, destino final, nesse 21/12. Nas quase sete horas de voo entre Doha e a capital inglesa, entre a leitura de um texto e outro da obra jornalística de Gabriel Garcia Marques, o Gabo aos íntimos, vim remoendo muito do que aconteceu na Copa 2022. Argentina campeã. Marrocos arrebatador, França por pouco não emenda o bi, Croácia resoluta. Qatar, o país, lado bom e ruim. E me vem a pergunta crucial:

O que se passa com a Seleção amarela?

E mais outra questão: por que não temos um debate aprofundado a respeito da epopeia de seis anos de Tite – o prejuízo técnico e retrocesso absurdos que ele proporcionou ao futebol brasileiro com a queda precoce na Copa por duas vezes consecutivas?

Da Seleção se tem muito o que falar.

A falta de um modelo. Uma gestão com critérios técnicos e psicológicos. Um novo perfil de time, de jogadores e, radical, uma comissão técnica de sábios do futebol e não apenas analisadores de planilhas – maioria no comissariado de Tite.

Integração total das seleções de base com a principal. Não em comando apenas, mas em estilo, projeto.

Prospecção de jovens jogadores no Brasil e fora do país, acompanhamento rigoroso dos talentos. Acabar com o desperdício de meninos promissores.

Para se ter ideia do desperdício, veja o que aconteceu com o grupo de garotos campeões mundiais Sub-17 em 2019 – torneio Fifa disputado no Brasil. Três anos após a conquista, nenhum dos meninos chegou à seleção principal e até mesmo alguns foram preteridos em seus clubes de origem.

Tite deve sim ser debatido. Por seis anos, parte da mídia se ajoelhou perante ao treinador. Essa corrida desembestada por clics de influencers nas redes sociais. Quantidade sem precedentes de mesas redondas nos canais a cabo – das 9h da manhã até meia-noite, todos os dias. Uma crônica esportiva cada vez mais longe do jornalismo. E o aumento do número de ex-jogadores na função de comentaristas e analistas na TV. Tudo isso junto deu a Tite a paz que nem ele esperava.

Quase ninguém cobrou Tite por não testar para valer, não dar vez, a jogadores que atuam no futebol brasileiro, como Dudu, Scarpa, Marcos Rocha, Rodinei, Gabigol, entre outros esquecidos. Ou mesmo os de fora, como Claudinho (ex-Bragantino), eleito melhor jogador do Brasileirão de 2020.

Tite nunca abriu mão de questionáveis, caso de Fred, o rei das planilhas no Manchester United, e sem lastro de jogador de Seleção. Com Tite, Fred foi à duas Copas do Mundo. Correto?

Se sairmos da Seleção e o legado de Tite, vamos chegar aos desmandos da CBF. Mergulhada até o pescoço na crise de gestão e malfeitos desde a queda de Ricardo Teixeira em 2012, a entidade maior do futebol nacional só agora com Ednaldo Rodrigues parece retomar respiração normal.

foto: Twitter Fifa

Está nas mãos e cabeça de Ednaldo o futuro da Seleção e, por tabela, do futebol brasileiro. Mais que um nome para suceder Tite,  urgente a reestruturação do nosso futebol.

Não pode desprezar o impacto de uma Copa do Mundo. A queda em Doha dos amarelos, Tite e seu comissariado.

A derrota diante da Croácia não pode ser esquecida, nem tratada como apenas um perde e ganha do futebol.

E a chamada crônica esportiva brasileira, antes decisiva nas conquistas das Copas de 1958, 1966, 1970, 1994 e, até um pouco menos em 2022, tem de rever seu caminho.

Ou como publicou Gabriel Garcia Marques em julho de 1966, no jornal El Espectador de Bogotá: “Pessoalmente, acredito que o escritor, como tal, não tem outra obrigação revolucionária senão a de escrever bem.”

No nosso caso do jornalismo esportivo temos obrigação não só de escrever bem como também provocar o bom debate e não apenas se preocupar em aumentar os milhões ou dezenas de seguidores.


Londres, 21 dezembro, 2022. Por Luiz Antônio Prósperi

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