Cristóvão Borges não é Tite. Não tem o mesmo estilo de Tite e o Corinthians sabe disso. O novo treinador, contratado neste domingo (19/6) para suceder o agora técnico da Seleção Brasileira, só vai dar certo se paciência houver por parte do clube, torcida, jogadores e imprensa. Tolerância também entra nesse pacote, uma vez que Cristóvão já foi vítima de discriminação e insultos racistas.
Fora do campo, Cristóvão não é de se omitir. Fala o que pensa, defende suas ideias. É um contestador. Bem diferente de Tite, de casca grossa, sem abrir até mesmo em quem votou nas últimas eleições presidenciais.
Dentro de campo, o Corinthians vai encontrar um sujeito sereno, tom professoral. Cristóvão não é mais um treinador a perambular pelo futebol brasileiro. Seus conceitos levam em conta muita organização tática, troca de passes.
Não esperem dele ousadias. Nem essa história de que é preciso ter raça, ralar na grama. Ele bebeu na fonte de grandes treinadores do Brasil e lá de fora.
Seu cartel ainda não tem conquistas de relevância, assim como Tite e Mano Menezes também não tinham quando aportaram no Corinthians. Não é um vencedor. E deve enfrentar forte rejeição da torcida que esperava por um nome de impacto ou algum técnico ousado, da nova geração, se é que o Brasil tem treinadores assim.
No currículo de Cristóvão consta o excelente desempenho no Vasco de 2011 e 2012, temporadas em que deu muito trabalho a Tite nas disputas do Brasileirão e Copa Libertadores.
Dirigentes do clube paulista, parece, levaram em conta a história daqueles embates ao optar por Cristóvão.
Afinal de contas, ele foi uma das últimas opções depois de Sylvinho, Fernando Diniz, Eduardo Baptista e Dorival Júnior.
Depois do Vasco, Cristóvão passou por Bahia, Fluminense, Flamengo e Atlético-PR. Sem muito sucesso.
No Flamengo, revelou suas maiores queixas com a intolerância. Em agosto de 2015, abriu o jogo em entrevista à ESPN Brasil.
Veja o que Cristóvão disse sobre os problemas que enfrentava no clube carioca:
“Venho sofrendo críticas que fogem do padrão normal do futebol. Começam com as críticas, as críticas insistentes, contínuas e diárias. Existem críticas exacerbadas que, por serem sistemáticas, viraram perseguição. E algumas com conotação racista, sim. Então vira perseguição e, no conteúdo de algumas dessas críticas, existem componentes racistas, sim. Por exemplo, foi citado que o Flamengo, na hora de escolher o treinador, deixou de escolher o Oswaldo de Oliveira para escolher o do Pelourinho”
“Me sinto preparado para estar aonde estou, mas quando me atinge como cidadão, vou procurar meus direitos para me fazer respeitar. Somos uma democracia, mas o racismo às vezes é camuflado”
No Flamengo, em 15 partidas, acumulou sete vitórias, um empate e sete derrotas.
“A tolerância comigo é diferente, sempre foi. Sou um treinador que sempre foi bastante criticado, não só agora, mas a minha função, assim como de um árbitro, sempre tem críticas, mas nunca reclamei delas. Para algumas pessoas eu sou tido como um abusado, de estar em uma posição em que eu coloco minhas ideias e contesto caso necessário. Minha posição não é de pobre coitado”.
Veja o que Cristóvão disse quando assumiu o Bahia em agosto de 2013:
“Minha bandeira como negro é dar certo no futebol. Sei que isso possibilita uma mudança de mentalidade, de conceitos, de costume. Isso não me pesa, de forma alguma.É um desafio que me estimula. Estudei e me preparei para isso. Carrego essa vontade de mudança.”
“Sou petista, isso desde os tempos de jogador. Mas não tenho carteirinha nem sou militante. É uma opção individual minha, ideologia. Mas tenho críticas ao partido. Sei que eles têm muitos erros e grandes acertos. Fui favorável às manifestações nas ruas (em 2013) durante a Copa das Confederações. Achei aquele momento lindo e gostaria muito de ter participado. Acho que o Brasil, assim como o futebol, vive tempos alternativos. E isso é ótimo.”
Natural de Salvador, Bahia, Cristóvão Borges tem 57 anos e foi meia do Corinthians entre 1986 e 1987.