Neymar está longe de ser Romário e muito distante do carisma de Ronaldo Fenômeno quando esses dois eram protagonistas em seus clubes e na Seleção Brasileira. Eles não foram moldados e tiveram inteligência suficiente para conciliar idolatria e bola. Não vai ser a conquista da medalha de ouro nos Jogos do Rio contra Alemanha que vai mudar essa história.
Não é o que acontece com Neymar, até aqui refém do seu enorme talento e da carência absoluta de grandes craques no futebol brasileiro.
Aos 24 anos, sem uma conquista de peso com a camisa amarela e coadjuvante de Lionel Messi no Barcelona, ele não é unanimidade nem mesmo no Santos, onde nasceu para o futebol e comprou briga com dirigentes após sua ida para a Espanha.
O problema de Neymar nem é a baixa estima da Seleção Brasileira. Não cabe apenas a ele tirar o escrete do buraco em que se meteu. O craque não é o culpado pela crise de identidade do futebol brasileiro.
Falta a Neymar entender o que se passa a seu redor e deixar de arrumar subterfúgios para se isentar das críticas. Falta ao jogador um assessor de respeito, que conheça os subterrâneos da Seleção e das entranhas do futebol, e não familiares e amigos de ocasião a referendar todas as bobagens que comete.
Não vai ser com esse vídeo, divulgado nesta sexta-feira (19/8), véspera da decisão do ouro nos Jogos do Rio, que vai reconciliar Neymar com sua gente.
ROMÁRIO & RONALDO
Este jornalista deste Blog do Prósperi acompanhou de perto Romário na sua grande Copa, em 1994 nos Estados Unidos, e Ronaldo Fenômeno, em 1998, 2002 e 2006. Assim como Neymar hoje, os dois eram referência em campo e fora do gramado eram mestres na dissimulação.
Na Copa de 94, Romário passava bons momentos fora dos treinamentos sentado no banco da comissão técnica sempre de binóculos. Não mirava os movimentos dos companheiros no campo. Seu alvo eram as garotas acomodadas nas pequenas arquibancadas da Universidade de Santa Clara, onde o escrete de Parreira treinava. Elegia a que mais lhe agradava e depois delegava a tarefa de marcar o encontro a assessores do seu estafe.
Quando tinha de encarar a imprensa, obrigava jornalistas a formarem imensas filas para ter pelo menos cinco minutos de prosa com o craque. Todos obedeciam e saíam satisfeitos com as breves entrevistas.
Romário se divertiu à beça na Copa de 94, treinou duro quando necessário e voltou ao Brasil com a taça do tetra nas mãos e abençoado pela torcida, uma nação inteira.
Ronaldo, apesar do enorme carisma na Copa de 98, ainda era o Ronaldinho – um queridinho da torcida brasileira. Tinha 21 anos. Não se divertiu naquele Mundial da França. Sofreu com dores no joelho e a convulsão no final da Copa. Jogou muita bola e voltou de mãos abanando.
Em 2002, já com o assessor Rodrigo Paiva como suporte, se transformou em protagonista do penta, após dois anos de infortúnios com lesões que remendaram seus joelhos. Não se divertiu na Coreia e Japão porque estava subordinado ao comando de Felipão.Voltou ao Brasil com a taça no colo.
Dali para frente, dominou ainda mais a Seleção com certas regalias em treinamentos, eventos e virou o “presidente” do escrete até se render ao descaso e à fadiga do corpo.
Romário e Ronaldo Fenômeno poderiam ter em Ronaldinho Gaúcho o sucessor perfeito. Assim como Neymar, Ronaldinho encantava serpentes nos jogos do Barcelona e na Seleção. Fazia o diabo com a bola nos pés. Fora do campo, também era infernal nos prazeres da vida.
Ronaldinho Gaúcho era unanimidade nacional entre 2002 e 2006. Ídolo. Acompanhei de perto também sua ascensão na Copa de 2002 até o cadafalso quatro anos depois na Alemanha quando praticamente desistiu de ser o maior de todos até virar um jogador mambembe, circense, a alegrar plateias em rincões carentes de bom futebol.
Neymar ainda não chegou aos pés da idolatria de Ronaldinho Gaúcho nem é o protagonista que Romário e Ronaldo foram um dia.
O que ele tem nas mãos é conquista da medalha de ouro neste sábado contra um adversário de peso e na medida, a temida e emblemática Alemanha, nos Jogos do Rio.
Mesmo se pendurar o ouro no pescoço, Neymar não vai virar unanimidade. Ele ainda não entendeu o que é ser diferente. Não basta ser um mago com a bola nos pés. É preciso cabeça. Quem afaga hoje, joga pedra amanhã.
Se eu fosse Neymar, teria um conversa com Rivaldo, outro monstro sagrado do futebol brasileiro apesar de pouco reconhecido.
Em 2000, um dia antes de a Seleção enfrentar a Bolívia pelas Eliminatórias da Copa de 2002 no Maracanã, Rivaldo vinha no ônibus da delegação do Aeroporto Santos Dumont até o hotel em São Conrado no Rio.
No caminho, Rivaldo percebeu a insatisfação dos torcedores com a Seleção, que vivia um momento ruim. Quando o ônibus parou em um semáforo, um menino descalço, short sujo e sem camisa fez aquele gesto repugnante com o dedo a Rivaldo.
“Cara, um menino deu o o dedo pra mim. Isso é muito triste, não merecemos. Era um menino pobre como eu fui em Pernambuco. Chorei quando vi o menino dando o dedo. É muito triste”, me contou, inconformado, Rivaldo, que dois anos depois faria a diferença na conquista da Copa de 2002 na Coreia e Japão.
Neymar tem exemplos a seguir. É só abrir a cabeça.